domingo, 1 de agosto de 2010

O Projeto


Minha casca muda todos os dias, para que eu possa caber em mim. Assim como meu espírito que cavalga junto aos ventos à procura do ‘’eu’’ que perdi.
O que é nossa identidade? E por quem somos nós?
Nosso corpo e aquilo que nos cobre
não deveriam ser um só? 




Segundo os que vieram antes de nós, e antes de todo o sangue que fora derramado nessa terra, nosso espírito é um som. O som do nosso ser. Nossa alma é a música que nos canta, e o corpo, a dança que materializa o existir.
Eles reverenciam seus ancestrais, como agradecimento, por estes terem tecido, com os elementos da mãe terra, o nosso organismo, e inserido nele os sete tons que regem a vida.
Por isso pintam suas peles, para marcar o ancestral de quem nasceram, para mostrar ao mundo quem são, de onde vieram e para onde gostariam de ir. Eles entendem seu corpo como o recipiente sagrado, que carrega sua alma e lança ao mundo sua música interna.
Para nós, o corpo é uma massa de carne vulgar que deve possuir cada vez menos carne para que os ossos fiquem bastante à mostra e possam, sem incomodo algum, a roupa carregar. E a roupa sim, sustenta nossa alma e lança ao mundo a música interna, que muda de ritmo a cada estação…




A criação de uma peça altamente mutante que me acompanhe diariamente por seis meses é a proposta desse trabalho. Para que se discuta o vestuário, a identidade e o corpo.
Para que se discuta o ato de vestir-se e se encenar ao mundo.
Esse processo será documentado visual e textualmente, e será publicado nesse blog, que entrou ao ar no dia 01 de agosto de 2010 e será atualizado diariamente durante o período de uso da peça.
Nesse blog as pessoas poderão interagir com a experiência (através de comentários, críticas, sugestões, etc.) refletindo assim, a relação do indivíduo enquanto ‘’ser que se veste’’ com o mundo que o cerca.
Serão produzidas três peças idênticas, para possibilitar o  uso contínuo. E, a princípio, não se trata de uma peça comercial.
O uso contínuo da peça apresentará seus defeitos de uso e/ou acertos de construção. Sua modelagem e/ou materiais utilizados serão repensados (ou não) após o período de uso, quando outro produto poderá ser apresentado.(Dependendo de como a peça se comportar durante o processo de uso contínuo.)
O resultado dessa experiência culminará no meu tcc, que será defendido no final de 2011.







Repensar o corpo e aquilo que o veste, encarando-o como o ser sagrado que é. Como materializar nossas experiências pessoais através de um vestuário que não muda? Desde o nosso nascimento até o derradeiro dia que muitos chamam de fim, deparamo-nos com a realidade de nosso corpo. Essa massa de carne que carrega e emoldura nosso espírito enquanto ser que existe no espaço. Um organismo vivo em constante modificação que nos acalenta por todo um ciclo de vida. 
Todos os dias, diante o espelho, enfrentamos o mesmo rosto. Por mais que os anos e nossas escolhas possam modificá-lo, sabemos que sua estrutura é a mesma. Não importa o quanto nos modifiquemos, nossos olhos, células, -pele e espírito serão sempre os mesmos. Acosmumamo-nos (ou não) com essa casca sagrada e, muitas vezes, acabamos ignorando seu teor divino.
Para isso proponho essa experiência, onde o conceito de um corpo que sempre muda mas permanece intacto, protegendo um espírito que o precede e que o abandonará para seguir outros caminhos no fim de um ciclo, seja transposto para o vestuário . Discutindo assim  a relação que os nativos pré-colombianos tem com o corpo e como essa relação poderia ser vivida em uma sociedade ocidental.





Fotografias: 1: índios Kaiapó, Xingu. 2: índio Yawalapti, Xingu. 3: índio Ashaninka, Acre.
Referências bibliográficas: JECUPÉ W. Kaka. A Terra dos Mil Povos. São Paulo. MACRONE. / VIDAL Lux, Grafismo Indígena. São Paulo. EDUSP


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